quinta-feira, abril 06, 2006

Segurança Pública - Realidades e "Achismos"

Segurança Pública é um conceito amplo que dá margem a diferentes interpretações sobre sua natureza. Em geral, toda matéria desta espécie permite o exercício da reflexão, e, daí nascem muitas vezes “achistas profissionais”, ou melhor, pessoas especializadas em dar palpite sobre este ou aquele assunto, mas como bons “achistas” sempre fazem sua “análise” baseada em fatos esparsos e sem densidade, e ainda com o mínimo de aprofundamento ou estudo.

Para exemplificar um “achista clássico” em sua performance, poder-se-ia analisar o caso de certo deputado que deu entrevista, nos últimos dias, para grande rede de televisão brasileira. O parlamentar é o Presidente da comissão de Direitos Humanos do seu estado, e, evoluía em suas divagações efetuando uma “análise” sobre a segurança pública e a polícia.

Vários foram os “achismos” e especulações, mas um, em especial, gerou-me grande inquietação. Dizia ele: “propus à governadora que ela submeta todo corpo de polícia a duas avaliações. A primeira psicológica e a seguinte social”. Questionado sobre qual o objetivo e como seria a análise, o deputado emendou: “estabelecer quem tem condição psicológica de continuar a combater o crime e também, quem estaria socialmente adequado a continuar integrando os quadros das instituições.”. Em sua análise, nada menos que 60% dos policiais serão afastados do serviço por falta de condições .

Muito bem deputado! Avaliações sempre são bem vindas por toda instituição que deseja prestar bons serviços e evoluir. É, realmente os policiais deveriam ser avaliados.Sem dúvida policiais mentalmente debilitados devem ser aposentados se for o caso, ou mesmo submetidos a tratamento. Qualquer policial que disponha de patrimônio desproporcional aos seus ganhos também deve ser alvo do competente processo de investigação. Mas sem dúvida as avaliações deveriam ir mais longe: por exemplo, avaliar se tais policiais conseguem manter suas residências com o salário que recebem. Avaliar se tal servidor recebe incentivo para investir em suas carreiras. Avaliem ainda se esses homens reconhecem em suas chefias exemplos a serem seguidos no trato da coisa pública. Avaliar se os policiais acreditam que possa valer a pena colocar suas vidas em risco para prender os delinqüentes, mesmo sabendo que os mesmo ficam em grande parte das vezes impunes.E muitas outras avaliações.

Agora, já que o negócio é avaliação como solução para os problemas, quem sabe o ilustre deputado não topa propor, dentro de sua própria lógica, avaliações de sua própria casa legislativa. Sim, pois será que ao contrario do que o deputado buscou insinuar contra os policiais, isto é, que são despreparados psicologicamente e corruptos em sua maioria. Será que seus pares, os políticos, estão livres de reprovação social, psicológica, intelectual e moral? Ao contrário do Deputado, permitirei que cada qual faça seu juízo e tire suas próprias conclusões ou mesmo “achismos”.

Não há dentro do sistema público categoria que esteja acima de qualquer suspeita.Também não é mentira que possam existir desvios por parte de qualquer servidor. Assim, poderíamos crer que quando se fala em avaliação esta não deve ser totalmente descartada.O que não pode é sujeitar a investigação qualquer categoria com base em “achismos” empíricos sobre eficiência ou “potencial” corruptivo. Isto é no mínimo discriminação funcional e preconceito.

Toda a administração do Estado deve ser submetida a controles, e tais já estão devidamente orientados inclusive pelo texto constitucional. Não podemos permitir que se misture o caráter de controle com o ato de investigação, pois o segundo só deve ser estabelecido contra àqueles que cometem crimes ou em relação aos que são objeto de denúncias, que com respeito ao devido processo legal deverão aí sim ser sujeitos a devida investigação.

Sem os pilares anteriormente expostos, qualquer método de avaliação no sentido de investigação será um ato arbitrário e de abuso contra o servidor. Nosso direito consagra o princípio que diz ser inocente todo àquele que não se provou culpado. Isto é: Investigar inocentes, ou mesmo quem não seja suspeito é ir contra os Estado de Direito e contra as máximas constitucionais.

Lembre-se a sociedade e o Ilmo. Deputado que a categoria funcional que mais defende os Direitos Humanos neste país é inequivocadamente a polícia. Todos os dias milhares de servidores colocam sua vida em risco para a defesa da vida e integridade dos cidadãos, de seu patrimônio e de seus valores morais.

A polícia é a instituição que não permite que facínoras matem, distribuindo entorpecentes para crianças e jovens, que impede que pessoas sejam alvos dos mais hediondos crimes que chocam a humanidade. Sem dúvida teríamos aqui inúmeros exemplos de atuação em defesa dos Direitos Humanos por parte da polícia.

Assim, não podemos permitir que uma categoria tão sacrificada e digna, como a polícia, seja Civil ou Militar, seja atacada e estigmatizada por “achistas profissionais”, muito pior quando este “achista” é um deputado que tem o dever de conhecer os instrumentos legais e representar a sociedade, e, mais importante, deve ter o compromisso de buscar ações, de efetivo avanço social, no estabelecimento de Direitos Humanos para o povo. Infelizmente, ao contrário do seu dever ele prefere fazer “achismo” na TV.*

*Postado em 06/04/2006 por Everton Gomes.