terça-feira, julho 10, 2012

PM e pacificação - apenas uma charge?


A imagem emoldurada na charge "pm pacifica mais um" seria cômica caso não retratasse o arbítrio e violência com que o Estado conduz a política de segurança. O desenho nos revela um indivíduo negro, trajando vestes simples, aparentemente jovem, deitado em decúbito frontal, com manchas de sangue escorrendo ao seu redor num plano. No outro plano, um indivíduo branco, idade jovem, fardado, falando ao celular o seguinte: "Governador, pacifiquei mais um". É nítida referência às ações promovidas pela Polícia Militar nas áreas ditas pacificadas pelas UPP's.

A charge é um recurso de comunicação visual que busca apresentar uma crítica de forma hilariante. Todavia a imagem é chocante e, tamanha violência não deve ser naturalizada jamais. Lógico que o problema aqui não é do artista. Não é isso. O problema aqui possui raízes mais profundas, na lógica militarista, no belicismo descontrolado da polícia, num país desigual e injusto, nas amarras étnicas e sociais que perduram até os dias de hoje.

Os personagens mostrados são os de sempre: jovens, negros e pobres. E como o tema é a segurança, a pimenta é o PM. O território também é recorrente - a favela carioca. Quantos roteiros cinematográficos foram para as telas denunciando isto? E notícias de jornal, quantas diariamente? Será que isto não muda nunca?

Já realizei algumas considerações sobre o tema ‘Segurança Pública’ em episódios anteriores, mas, não custa continuar na luta.Afinal como diz a propaganda: sou brasileiro e nunca desisto.

Um eminente professor e sociólogo, amado por uns, odiado por outros, disse uma vez, em minha presença, que a Segurança Pública no país é ineficaz, pois padece de um grande mal promovido pelo pacto silencioso entre a esquerda e a direita. Afinal, dizia eu, do que fala este louco? O tal pacto diz respeito à forma como cada um destes segmentos políticos observam e atuam sobre tal temática.

A direita enxerga a segurança como o fio condutor de seus interesses econômicos e sociais. Econômico, pois a polícia é a grande protetora do patrimônio dos ricos e abastados, seu cão de guarda. Social, pois também este aparato protetor atua reduzindo e impedindo os miseráveis de se amotinarem contra as lógicas sociais que lhes impõe a elite dominante. Ou seja, para a direita, a segurança deve continuar como está,sem alterações, aliás, pode sim ser alterada sempre agindo de forma mais repressora e violenta, claro desde que isso funcione contra os pobres e favelados.

Já a esquerda se mostra ineficaz. Omissa! Recrudescida nos seus fantasmas do passado. Aprisionada sob a lógica da polícia enquanto aparato do regime militar que a prendeu e torturou. A esquerda se esquece da segurança nos seus programas de governo, a trata sempre de forma tangencial e filosófica, perde espaço. Deixa de fazer a segurança apenas atuando na lógica da sublimação ideológica. A esquerda deve deixar de se omitir. É mister que entre em campo e concretize ações novas, com viés progressista.A sociedade precisa desta contribuição urgentemente.

Precisamos, em nosso país, de uma série de reformas. Uma delas - e isto não exclui as demais - é a reforma da polícia. Talvez muitos não tenham atentado, mas após 1988 as instituições sofreram mudanças e se adequaram na maior parte das vezes ao regime democrático. A polícia, pelo contrário, continua inscrita na mesma lógica autoritária que consumou o golpe civil-militar no país. Precisamos rever isto já.

Sabe-se que a polícia continua usando métodos atrasados de investigação, promovendo violência quando deveria proteger, torturando, matando, etc. Quando seriamente este lastimável quadro será revisto de uma vez por todas? Só a sociedade pode pressionar neste sentido.

A corrupção deve ser combatida, a política remuneratória e de associação classista, repensada. A lógica de formação e qualificação deve ser reformada. O debate de outros temas como políticas de redução de danos em relação à droga, educação, redução de pobreza e desigualdade são, também, fatores externos que devem permear a mudança estrutural brasileira e que vão auxiliar a melhoria da ação de segurança pública. Espero que muitos outros venham somar nesta luta que visa construir um país melhor para esta e futuras gerações de brasileiros.

@Everton_Gomes , Inspetor de Polícia Civil, Mestre em Ciência Política e Bacharel em Direito, estudante do Programa de Especialização em Segurança Pública, Cultura e Cidadania da UFRJ além de Diretor do Sindicato dos Policiais Civis do Estado do Rio de Janeiro (SINDPOL-RJ)

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